Lamentamos a perda do grande professor e historiador Shozo Motoyama.
O professor presidiu por cerca de 15 anos o Jin’monken, o tradicional centro de estudos nipo-brasileiros, fundado em 1946. Um locus onde japoneses que se emigraram para o Brasil pensavam sobre o seu 'novo lugar' no Brasil, preocupando-se com a dita koronia japonesa, discutindo o seu futuro e os problemas atuais àquela época entre seus membros. Homens de grandeza ímpar passaram pela instituição, como Suzuki Teiiti, Wakisaka Katsunori, Tomoo Handa, Ando Zenpati, só para citar alguns dispensando quaisquer explicações.
A preocupação desses líderes era exatamente com o nível cultural dos imigrantes e seus descendentes circunscritos no seu mundo, longe dos centros urbanos, sem acesso à educação, não se formando nem japoneses e tampouco brasileiros. A incultura era uma das maiores preocupações dos líderes da época que esse era o espírito da fundação do Jin’monken. Shozo Motoyama, em últimas palavras, dizia se orgulhar de ter estudado e atingido o grau máximo na Academia, que era ser professor titular na mais renomada universidade brasileira, a Universidade de São Paulo. Nesse seu discurso está contida a herança dos seus antecessores. Ele próprio foi o modelo do que seus ancestrais desejavam para os descendentes.
Assim como o término da Segunda Guerra constituiu um divisor de águas, muitos japoneses, por imposição do Estado e também por estratégia familiar, decidiram não ensinar japonês aos seus filhos. Shozo Motoyama tem uma vantagem até nisso: depois de estudar no Brasil, foi aprimorar seus conhecimentos no Japão e aperfeiçoou a língua e a cultura dos seus ancestrais; fez disso uma ferramenta importante para as suas pesquisas e evoluiu enormemente como pesquisador no cenário acadêmico.
Shozo Motoyama não é conhecido apenas como professor titular em História das Ciências e Tecnologia do Brasil da Universidade de São Paulo, suas contribuições se estenderam às atuações como secretário e coordenador em diversas instâncias da Sociedade Brasileira da História das Ciências, na década de 1980; depois ainda o professor contribuiu enormemente como organizador nas publicações de livros que registraram a história das instituições de pesquisa em São Paulo como a FAPESP e na esfera nacional, o CNPq, na década de 1990 e 2000.
Não pararam aí o seu engajamento como historiador, nas últimas décadas ainda se dedicou a orientar alunos no Programa de Pós-graduação em Língua, Literatura e Cultura Japonesa da USP, com temas voltados à imigração japonesa, concomitantemente exercendo a presidência do Jin’monken, formando vários pesquisadores que hoje estão espalhados pelo Brasil e Japão.
Nos últimos meses, durante a sua participação nas reuniões da comissão científica do Museu de Imigração Japonesa manifestava mais do que ninguém a sua preocupação em registrar pessoas que iam sendo apagadas da história da imigração japonesa, demonstrou preocupação em criar um registro que permitisse a perpetuação da história e da memória da imigração.
Costumava dizer que há uma subvalorização da elite intelectual pelos assuntos da koronia japonesa, incentivando mais pesquisadores a fazerem o que mais precisa: estudar a tão superdiversificada comunidade Nikkei, incluindo-se japoneses e seus descendentes.
O professor deixa saudades também pelo seu aspecto pessoal, por essa leveza de alma e símbolo de serenidade. Uma pessoa que definitivamente transitou entre a Academia Brasileira e a comunidade Nikkei, sendo um presidente que deixa marcas indeléveis por ter fortalecido a ponte com a Academia com inserção de estudantes para fomentar pesquisas sobre a comunidade Nikkei. Nossa homenagem à sua memória é dar continuidade ao trabalho de fortalecer a pesquisa no vernáculo e formar novas gerações de pesquisadores para aprofundar o vínculo com o Centro e também despertar o interesse da comunidade Nikkei e não-nikkei em geral.
Nossa profunda gratidão!