Os imigrantes japoneses e suas famílias no Brasil
Os primeiros imigrantes
Atualmente, a maioria dos japoneses do Japão já se esqueceu de que, até meados da década de 70, o governo japonês vinha adotando uma política emigratória para “exportar nacionais em massa” para diversos países das Américas — e, mais tarde, de outros continentes. A modernização do país, que teve início na segunda metade do século XIX, trouxe consigo um crescimento demográfico sem precedentes, e a instabilidade econômica que se seguiu à Guerra de Seinan (1877) abalou profundamente as estruturas das pequenas vilas rurais no interior do Japão, forçando o Estado a adotar uma política emigrantista agressiva (que tinha, dentre seus objetivos, incentivar a população a acumular riquezas em terras estrangeiras) como forma de conter as crises econômica e populacional que se iam avolumando. A partir de 1868, quando começa a emigração de japoneses para o Havaí, diversas empresas de emigração foram surgindo, uma após a outra, e a emigração entrou na pauta dos principais debates políticos do Japão. À medida, porém, que o movimento anti-japonês foi ganhando impulso na América do Norte, muitos emigrantes passaram a preferir os países sul-americanos como destino. Dentre esses países, o principal pólo receptor foi o Brasil, que, desde a abolição da escravatura (1888), lutava contra a escassez de mão-de-obra na lavoura.
Na primeira metade do século XX, vieram para o Brasil na condição de imigrantes muitos japoneses, boa parte dos quais foi se dedicar ao trabalho nas lavouras (sobretudo de café) — movimento que teve início em 1908, com a chegada dos 781 imigrantes do vapor Kasato-maru ao porto de Santos (SP). As diferenças entre os slogans veiculados no Japão pelas companhias de emigração e a realidade que os imigrantes encontravam aqui (principalmente no que diz respeito aos salários pagos e às colheitas miraculosas que se poderiam obter) eram gigantescas, e muitos dos que vieram para cá com o objetivo de acumular pecúlio e retornar rapidamente para seu país de origem se viram em condições deveras precárias, tanto no que diz respeito à moradia quanto à nutrição e cuidados médicos.
A sucessão de crises ocorridas no Japão do início do século XX (as Revoltas do Arroz em 1918, o Grande Terremoto de Kantō em 1923, a crise financeira de 1927, e a Grande Depressão, em 1929) tiveram um impacto tremendo sobre as pequenas vilas rurais. O governo japonês, a partir de 1925, passou a incentivar com grande pujança a emigração para o ultramar e a oferecer altos subsídios para aqueles que estivessem dispostos a deixar o país. Estima-se que, entre 1908 e 1941, cerca de 188 mil japoneses tenham imigrado para o Brasil; só no intervalo entre 1925 e 1935 foram 135 mil imigrantes. Esse período ficou conhecido entre os imigrantes como o “período da imigração subsidiada”.
Estado Novo, Segunda Guerra Mundial e os confrontos entre “vitoristas” e “derrotistas”
A partir dos anos 20, começaram a surgir entre os imigrantes aqueles que adquiriam suas próprias terras para o cultivo, e desde os anos 10 os imigrantes já se concentravam nas grandes cidades (sobretudo em São Paulo). Porém, com a ascensão do nacionalista Getúlio Vargas ao poder, em 1937, e o subsequente surgimento do Estado Novo, foram proibidos o ensino e os jornais em língua japonesa, e à vida comunitária dos japoneses foram impostas restrições severas. Além disso, com a entrada do Japão na Segunda Guerra Mundial, o governo brasileiro rompeu as relações diplomáticas com o governo japonês, e além de se proibir o uso da língua japonesa fora do âmbito doméstico, parte das fazendas, casas comerciais, fábricas, bancos e hospitais possuídos por japoneses passaram às mãos do governo brasileiro. Com o retorno dos representantes diplomáticos japoneses ao país de origem, os imigrantes que aqui permaneceram perderam o contato com o Japão, e mesmo a troca de informações entre os próprios imigrantes foi seriamente prejudicada.
As condições peculiares impostas aos imigrantes neste período foram uma das causas do surgimento, na segunda metade da década de 40, de conflitos entre aqueles que acreditavam na vitória japonesa sobre os Aliados na Segunda Guerra (“vitoristas”) e aqueles que reconheciam a derrota (“derrotistas”), resultando por vezes em manifestações extremistas e no assassínio de pessoas envolvidas.
O imigrante do pós-guerra e a atual situação da “colônia japonesa”
Da metade da década de 50 em diante, em resposta ao rápido crescimento populacional do pós-guerra, o governo adotou novamente uma política de emigração em larga escala, sendo criados para tanto o Setor de Emigração (do Ministério das Relações Exteriores) e a Federação das Associações Ultramarinas do Japão. De 1952 a 1973, imigraram para o Brasil 60 mil japoneses, que contribuíram para o crescimento da “colônia” japonesa neste país.
A maioria dos pioneiros da imigração lançou-se ao trabalho agrícola em algum momento; sua contribuição à economia brasileira, enquanto agricultores, é notável. Muitos dos descendentes não continuaram na atividade agrícola — alguns se destacam na política, economia, ciência, medicina etc., razão pela qual hoje merecem o respeito da sociedade brasileira como um todo. Atualmente, os japoneses e seus descendentes perfazem menos de 1% do total da população brasileira, com cerca de 1,4 milhão de indivíduos; no entanto, sua existência faz-se notar na vida quotidiana do país. Comparado aos outros países da América Latina, o Brasil é um país excepcionalmente simpático aos japoneses.
O movimento “decasségui”
Em decorrência da crise econômica que atingiu o Brasil em meados dos anos 80, muitos imigrantes japoneses radicados no Brasil e seus descendentes começaram a se dirigir ao Japão em busca de emprego. Com a reforma da Lei de Acolhimento de Imigrantes e Refugiados, em 1990, os netos de imigrantes e seus cônjuges passaram a ter direito ao visto de longa permanência, fazendo crescer significativamente o número de nipo-brasileiros que iam ao arquipélago para trabalhar. Esse fluxo migratório ficou conhecido como “movimento decasségui”, em virtude das semelhanças com os imigrantes que vinham do Japão para o Brasil (“decasségui” é o nome da prática de emigrar temporariamente para acumular pecúlio). Atualmente, são mais de 300 mil indivíduos com cidadania brasileira vivendo no Japão, muitas das quais concentram-se nas províncias de Aichi, Shizuoka e Gunma (região industrial), fazendo crescer o número de falantes do idioma português no país. Questões relativas ao apoio à educação dos jovens “decasséguis” têm se tornado cada vez mais importantes nos últimos anos no seio da “colônia” japonesa no Brasil, visto que os “decasséguis” costumam manter fortes os vínculos com seus familiares que permaneceram no país.
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